Totalitarismo em gotas

Assisti ao videozinho bem produzido estrelado pelos globais de sempre e alguns novos. Então, seguindo sugestão, resolvi pensar um pouquinho…

Belo Monte é uma obra superfaturada e vai ser instalada num local onde há seca prolongada? Sendo assim, até aí, eu fico indignado também. Ponto.

Mas e a energia eólica – quando não venta, faz como? Quanto custa sua implantação? Qual sua eficiência energética?

E os “índios”, quando vão virar cidadãos brasileiros de verdade, sujeitos aos mesmos direitos e, principalmente, deveres? Quando deixarão de ser equiparados às crianças e incapazes? Uma reserva indígena é um país à parte? Devem vigorar outras leis? Quem deve ter a soberania sobre estas áreas: o Brasil ou os países representados pelas ONGs nefastas que só querem nosso atraso?

Me lembrou a celeuma em torno do novo código florestal, cuja campanha contrária foi capitaneada por gente que ou não leu o texto ou mentiu dizendo que ele continha coisas que não continha.

Eu li.

Voltando às perguntas – Comida nasce em gôndolas de supermercado? Existe almoço grátis? E energia?

Mas o pior não está aí.

Como sempre desconfio de boas causas – milhões de pessoas já foram e continuam sendo mortas em nome de algumas – Eu li a apresentação do site do movimento Gota d’Água. Em 18/11/2011, o conteúdo integral era o que está no fim deste post.

Belo Monte é só uma isca, e eu tô fora dessa “causa”! Não pela Belo Monte em si, que tem cheiro, cor e gosto de escárnio, como projeto e como política – também posso ser contra, mas não por ser uma hidrelétrica. O que este movimento pretende é outra coisa. É consolidar um método.

Vejamos o que eles dizem:

“Queremos mostrar que o bem é um bom negócio” – Conforme o noticiário envolvendo ONGs boazinhas, partidos e ministros nos mostra dia sim, dia também, isso não é nenhuma novidade, é fato! 

“O Gota D’Água é uma ponte entre o corpo técnico das organizações dedicadas às causas socioambientais e os artistas ativistas.” – Ah, tá, agora entendi… Se você é um artista em busca de uma causa, o Gota d’Água é o lugar certo!

“A missão da Gota D’Água é comover a população para causas socioambientais utilizando as ferramentas da comunicação em multiplataforma (…) Nossa proposta é usar estas inovações para seduzir e mobilizar a sociedade para causas socioambientais.” – o que isso quer dizer? Bem isso eles não dizem, mas é algo mais ou menos assim: “As causas nós (o corpo técnico das organizações dedicadas às causas socioambientais e os artistas ativistas) decidimos. A vocês, distinto público, cabe a missão de nos emprestar alguma credibilidade sempre que tocarmos nosso berrante.”

Hoje é Belo Monte. Amanhã…

Agora vejam o voto ditrital, por exemplo. O projeto de reforma política que pode tirar o Brasil do atraso de verdade e até criar mais dificuldades para futuras “Belomontes” estacionou em menos de 120 mil assinaturas até o momento em que redigi este post, e está no ar há meses. Já a histeria “gotadagüística” acumulou muitas centenas de milhares de assinaturas em dias… Uau, essa causa deve ser boa mesmo!

Eles acreditam que um mundo melhor é possível. Eu continuo acreditando que o mundo possível é melhor.

 

* * *

Íntegra do texto de apresentação do projeto Gota d’Água em 18/11/2011

Um mundo melhor, mais consciente e solidário.

O Movimento Gota D’ Água surgiu da necessidade de transformar indignação em ação. Queremos mostrar que o bem é um bom negócio e envolver a sociedade brasileira na discussão de grandes causas que impactam o nosso país. Utilizamos nossa experiência em comunicação para dar voz aqueles que se dedicam a estudar o impacto que as decisões de hoje terão no amanhã. O Movimento apoia soluções inteligentes, responsáveis, conscientes e motivadas pelo bem comum. O Gota D’Água é uma ponte entre o corpo técnico das organizações dedicadas às causas socioambientais e os artistas ativistas.

A primeira campanha do movimento discute o planejamento energético do país pela análise do projeto da hidrelétrica de Belo Monte, a mais polêmica obra do PAC. O braço técnico desta campanha é formado por especialistas ligados a duas organizações de reconhecida importância para a causa: “Movimento Xingu Vivo Para Sempre” e o “Movimento Humanos Direitos”.

A missão da Gota D’Água é comover a população para causas socioambientais utilizando as ferramentas da comunicação em multiplataforma – Hoje existem inúmeros caminhos de se produzir conteúdo relevante para atingir e envolver as mais diversas audiências nos mais diferentes meios. Nossa proposta é usar estas inovações para seduzir e mobilizar a sociedade para causas socioambientais.

Conselho: Maria Paula Fernandes, Sergio Marone, Marcos Prado, Juliana Helcer, Enrico Marone, Ana Abreu, Sérgio Maurício Manon, Tica Minami, Ricardo Rezende, Luciana Soares de Souza, Ana Luiza Chafir, Thiago Teitelroit, Maria Paula Fidalgo, Luiza Figueira de Mello, Paulo Fernando Gonçalves, Carolina Kuenerz, Fernanda Mayrink, Miguel Pinto Guimarães.

Alô, Dimenstein: eles também acham que a função do jornalista é educar seus leitores.

Como o Reinaldo Azevedo apontou em seu blog (aqui e aqui) Roberto Dimenstein produziu dois textos para dizer o mínimo sofríveis a respeito da doença de Lula e seus desdobramentos na imprensa e opinião pública. (Aqui o primeiro texto) No segundo texto, Dimenstein chega ao fim com esta pérola:

“Isso significa quem um dos nossos papéis como jornalistas é educar os e-leitores a se comportar com um mínimo de decência.”

Então, para falar em um terreno, ele entrou em outro bem mais pantanoso: em minha humilde opinião, imprensa para “educar o povo” é coisa típica de totalitarismos. Todos os caras que acreditaram ou acreditam que a função do jornalista é “educar seus leitores”, invariavelmente tinham ou têm um ou até todos estes traços em comum: egolatria, fetiche com bigodes e barbas exóticos, fardas/ternos bem cortados, discursos inflamados e longos e a certeza de que sabem qual é o “caminho certo” que o mundo e a história devem seguir. Os mais “modernos(!)” vez por outra até usam agasalhos esportivos…

Pessoalmente, gosto quando os jornalistas têm opinião firme, sem vergonha de expô-la, desde que se limitem a manifestá-la a reboque dos fatos que informam, e não o contrário, segundo suas (e de outros) conveniências ou motivações, digamos, “pedagógicas”. Jornalistas só atribuem tamanha “missão” à sua classe nas seguintes hipóteses: burrice, delírio egóico ou desvio de caráter.

Entre fantasmas e assassinos…

Apresento aos leitores fragmentos de dois artigos reproduzidos pelo Instituto Von Mises do Brasil. Os links para os textos integrais estão no fim deste post.

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“Ordem e Progresso” tem sido o lema da bandeira brasileira desde que o país se tornou uma república em 1889. As palavras foram tiradas diretamente dos escritos de Auguste Comte. As ideias de Comte foram adotadas no século XIX pelas elites militares e políticas de grande parte da América Latina, e do Brasil em particular. Desde então, o espírito de Auguste Comte tem assombrado o subcontinente, e as consequências práticas dessa ideologia têm sido desastrosas.

O positivismo de Comte é melhor descrito como sendo uma ideologia de engenharia social. Auguste Comte (1798-1857) acreditava que após o estágio teológico e o estágio metafísico, a humanidade iria entrar no estágio principal, o “positivismo”, que para ele significava que a sociedade como um todo deveria ser organizada de acordo com conhecimentos científicos.”

(…)”Ludwig von Mises observou que “Comte pode ser desculpado, já que era louco no completo sentido com que a patologia emprega este vocábulo. Mas como desculpar os seus seguidores?”

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“O Chile na época do golpe militar estava imerso no caos econômico.  O presidente Allende, apesar de ter sido eleito com apenas 36% dos votos válidos (a direita teve 34,9% e os social-democratas, 27,8%), estava agressivamente implementando um programa econômico puramente marxista, como até mesmo o amplamente hostil obituário do The New York Times admite: “um programa socialista de confisco e estatização de minas, bancos e indústrias estratégicas; divisão e repartição de grandes propriedades rurais em fazendas comunais; e controle absoluto de preços”.  Não surpreendentemente, tais medidas, como o próprio Times reconhece, “rapidamente resultaram em acentuados declínios na produção, escassez absoluta de bens de consumo e inflação explosiva.”

Ademais, Allende centralizou e nacionalizou a educação e o sistema de saúde, distribuiu benefícios para seus aliados políticos e inflacionou alucinadamente a oferta monetária, o que levou ao colapso de toda a economia e ao endividamento maciço seguido do calote.  A inflação de preços foi combatida com o típico e anacrônico recurso do congelamento, o que deixou lojas e supermercados com prateleiras vazias, além de gerar revolta em todos os proprietários e empreendedores do país.”

(…)

“O general certamente não era nenhum anjo.  Nenhum soldado pode ser.  Ele foi repetidamente denunciado pela morte ou desaparecimento de mais de 3.000 cidadãos chilenos, além de acusado pela tortura de outros milhares.  É bem provável que um número substancial de chilenos inocentes tenha morrido ou desaparecido ou sofrido tratamentos brutais como resultado das ações de Pinochet.  Porém, em uma batalha para se evitar a imposição de uma ditadura comunista, é algo incontestável que a maioria daqueles que morreram ou sofreram torturas estavam preparados para infligir um número excepcionalmente maior de mortes e uma escala avassaladoramente maior de sofrimento aos seus conterrâneos.

A morte e o sofrimento desses propensos totalitários não deve ser lamentada, assim como não se deve lamentar as mortes de Lênin, Stálin, Hitler e seus respectivos auxiliares.  Tivesse havido um general Pinochet na Rússia em 1918 ou na Alemanha em 1933, as pessoas daqueles países, assim como o resto do mundo, estariam incomparavelmente melhores, exatamente em virtude da morte, desaparecimento e concomitante sofrimento de um vasto número de comunistas e nazistas.  A vida e a liberdade são positivamente auxiliadas pela morte e o desaparecimento desses seus inimigos mortais.  A ausência destas pessoas significa a ausência de coisas como campos de concentração e genocídios, e isso obviamente é algo que deve ser ardentemente desejado.”

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Os links para os textos integrais estão abaixo:

O espírito que assombra o Brasil

Ditaduras, relativismo moral e a necessidade de métodos brutais para se atingir o socialismo

Sem KY e com areia

A demonstração de autoritarismo do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, já segue o melhor estilo do legado pós-Lula. Dane-se a Constituição e o direito de ir e vir, dane-se qualquer lei e o bom-senso. Importante é a auto-glorificação por nada. Ontem, foi apenas por um show imposto goela abaixo dos moradores de Copa, sem consulta e com muito cinismo – “É o ônus de morar em Copacabana”.

Das 15h até 4 da manhã, nem os moradores puderam entrar ou sair do bairro de carro, numa data onde os deslocamentos são intensos para almoço e confraternização familiar. Ao arrepio das leis, Paes trocou a confraternização familiar de muita gente por stress e  prejuízos.

Este é o nosso porvir.

Ontem foi por um show na praia. E amanhã?

Felizes ânus novos para todos, porque depois dessa, passaremos a olhar por cima dos ombros o alcaide, o governador e a presidente enquanto, sem KY e com areia, desejamo-lhes sorridentes “Boas Entradas”.

*Parabéns ao Ricardo Gama (www.ricardogama.net) pela disposição, em pleno Natal. Vejam o vídeo abaixo.

A tarefa para o dia seguinte

Por KLAUBER CRISTOFEN PIRES | 26 SETEMBRO 2010

Publicado originalmente no site Mídia sem Máscara

Tendo sido quase impossível desviar-se da politiquice, que à medida que se abeira do desenlace final, vai se acalorando, proponho algumas reflexões para o dia seguinte, seja qual for o resultado. Usei o termo “politiquice” para ser mais apropriado. Não que eu não goste de política: na verdade, a detesto. Quanto mais política uma nação é, mais atrasada se torna. A política é o fenômeno de eternamente modificar as regras do jogo sem, entretanto, jogá-lo. Ao subordinar todas as instâncias da vida ao crivo político, estamos criando um moto-contínuo de reivindicações e contra-reivindicações e com isto negligenciando todas as oportunidades de crescer, tanto economica quanto tecnologica e espiritualmente.

A cada dia mais me convenço, para a minha felicidade, que uma hipotética vitória serrista terá vindo ao mundo da realidade não por conta dos seus louros próprios, mas por extremo demérito de sua rival e do que ela carrega em sua bolsa: a censura, a corrupção institucionalizada, a sujeição do Poder Judiciário ao MST, a consolidação do narcotráfico, a comunhão com todos os regimes tirânicos do planeta, o aborto e todas as formas de intervenção sobre o ninho familiar.

Isto considerado, isto é, a escolha entre uma candidata péssima e outro apenas ruim, ou entre uma tirana e um “déspota esclarecido”, tenho que teremos um ambiente, por incrível que pareça, profícuo para o florescimento de uma mentalidade anti-política, e aqui chego ao cerne da questão: não obstante todos os desmandos cometidos nos últimos quase oito anos do governo petista de Lula, em muitos aspectos ele e sua gangue apenas tomaram posse de institutos legais e de instituições voltadas para a intervenção estatal que já existiam previamente. Explico com alguns exemplos:

O Incra, de fato, houve por manipular os índices de produtividade das propriedades rurais, aumentando-os ao máximo possível com a finalidade de mais facilmente expropriar os seus donos, mas não foi neste governo que se emitiu o decreto que instituiu a estipulação e a mensuração da produtividade das empresas rurais. Isto já havia, e de modo completamente abusivo, absolutamente desvirtuado de qualquer fundamento econômico ou jurídico sério e até, avento, inconstitucional. Devemos seriamente colocar na pauta dos grandes debates nacionais sobre a justiça de o estado, por meio de um órgão lotado hegemonicamente por integrantes do MST, dispor da delegação para estabelecer unilateralmente tais índices por meio de ato administrativo despido de representatividade legiferante, isto é, se é que tais índices devem existir.

Como temos testemunhado, os proprietários rurais têm sido constantes vítimas do esbulho chancelado pela mão forte estatal, e isto, naturalmente, salta aos olhos de muitos cidadãos. Poderíamos, porém, imaginar que os agricultores fazem o mesmo conosco, os consumidores? Sim, eles também fazem o mesmo, por meio das políticas de preços mínimos, de compras garantidas pelo governo e de cotas de importação. Se o MST lhes esbulha as terras, eles saqueiam-nos os bolsos.

Além disso, temos as políticas antitruste: que são elas, senão arranjos institucionais pelos quais os empresários menos competitivos se agarram à saia estatal para praticarem preços altos, produzirem com qualidade inferior, estabelecerem cotas de mercado e outras invencionices completamente díspares de um funcionamento regular do mercado?

Passemos aos chamados “conselhos de classe” ou “ordens profissionais”, que legislam à revelia de qualquer traço de representatividade, assenhoream-se de atividades por declará-las como “privativas”, estipulam multas, fecham estabelecimentos, decretam pisos salariais e ordenam a contratação obrigatória de tais e quais profissionais. Será que não agem a favor dos seus associados e contra o restante de toda a população?

Um último estudo de caso, para que este artigo não fique chato por muito prolixo: afinal, por que raios as emissoras de televisão precisam operar sob a égide de uma concessão estatal? Não bastaria que tivessem a capacidade técnica e econômica para operarem? Pelo que vemos, resta-lhes somente a eterna subserviência ao mandatário da hora sob pena de ter o registro da concessão cassado ou ter a sua renovação indeferida.

Concluindo, de todas as formas o nosso Brasil tornou-se uma sociedade em que todos se escoram no estado para achacar seus compatriotas, utilizando-se para tanto de artifícios legais. Tornamo-nos uma sociedade em que todos são inimigos de todos; uma sociedade de desconfiança; uma sociedade de trincheiras, em que uma pessoa não é cidadã se não estiver protegida dentro de alguma organização classista.

Assim, seja quem for o nosso futuro presidente, apresento aqui a idéia de começarmos a realmente levantar estas nossas mazelas escorados em base em ampla e elevada discussão doutrinária, investigando cada uma delas profundamente e propondo a extinção das mesmas ou modificando-as de forma que se tornem mais justas, isto, é, sob o princípio-mor da igualdade de todos perante a lei. Nada destas coisas Lula e o PT criaram, mas dela souberam se aproveitar. São, pois, como hidras, a quem temos de cortar as cabeças, para que novas oportunidades não se repitam.

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Klauber Cristofen Pires é Bacharel em Ciências Náuticas no Centro de Instrução Almirante Braz de Aguiar, em Belém, PA. Analista-Tributário da Receita Federal com cursos na área de planejamento, gestão pública e de licitações e contratos administrativos. Dedicado ao estudo autoditada da doutrina do liberalismo, especialmente o liberalismo austríaco. Dono do blog LIBERTATUM (http://libertatum.blogspot.com), escreve para o Mídia Sem Máscara e outros sites. Em 2006, foi condecorado como “Colaborador Emérito do Exército”, pelo Comando Militar da Amazônia.

Para entender sem precisar desenhar

Hoje, reproduzo neste espaço artigo que explica melhor a quem ainda não compreendeu de qual substância exatamente é composta a essência de um movimento revolucionário. Grifos meus.

A promessa autoadiável

por Olavo de Carvalho

Quando nosso presidente diz: “Ainda não sabemos que tipo de socialismo queremos”, ele ecoa o que é talvez o mais clássico Leitmotiv do pensamento revolucionário. Karl Marx já opinava que era inútil tentar descrever como seria o socialismo, pois este iria se definindo a si mesmo no curso da ação anticapitalista.

O argumento com que Lula justifica sua afirmativa é exatamente esse. Em 1968, entre as explosões de coquetéis Molotov que tiravam o sono do establishment francês, Daniel Cohn-Bendit declarava que os estudantes revolucionários queriam “uma forma de organização social radicalmente nova, da qual não sabem dizer, hoje, se é realizável ou não”. E a versão mais sofisticada do marxismo no século 20, a Escola de Frankfurt, baseou-se na convicção de que qualquer proposta definida para a construção do socialismo é bobagem: o que importa é fazer “a crítica radical de tudo quanto existe”.

Critiquem, acusem, caluniem, emporcalhem, destruam o que encontrem pela frente, e alguma coisa melhor acabará aparecendo espontaneamente. Se não aparecer, tanto melhor: a luta continua, como diria Vicentinho.

Herbert Marcuse resumiu assim o espírito da coisa: “Por enquanto, a única alternativa concreta é somente uma negação.” O alvo final do movimento revolucionário é sublime demais para que seja possível dizer o que é: só se pode dizer o que não é – e tudo o que não participa da sua indefinível natureza divina está condenado à destruição.

Destruição que não virá num Juízo Final supramundano, com a repentina absorção do tempo na eternidade – coisa na qual os revolucionários não acreditam -, e sim dentro da História terrestre mesma, numa sucessão de capítulos sangrentos: não podendo suprimir todo o mal num relance, só resta ao movimento revolucionário a destruição paciente, progressiva, sem limite, nem prazo, nem fim. Cumpre-se assim a profecia de Hegel, de que a vontade de transformação revolucionária não teria outra expressão histórica senão “a fúria da destruição”.

Nessas condições, é óbvio que 200 milhões de cadáveres, a miséria e os sofrimentos sem fim criados pelos regimes revolucionários não constituem objeção válida. O revolucionário faz a sua parte: destrói. Substituir o destruído por algo de melhor não é incumbência dele, mas da própria realidade e se esta não chega a cumpri-la, isso só prova que ela ainda é má e merece ser destruída um pouco mais.

Poster de campanha para a eleição de 1930 do Reichstag. Ascenção democrática! Site da imagem no fim do post.

É claro que, na política prática, os revolucionários terão de apresentar algumas propostas concretas, seduzindo os patetas que não compreendem a sublimidade do negativo. Mas essas propostas não visam a produzir no mundo real os benefícios que anunciam, mas apenas a enfatizar a maldade do mundo e a aumentar, na mesma proporção, a força de empuxe do movimento destruidor. Eis a razão pela qual este último não conhece fracassos: como o processo avança mediante contradições dialéticas, todo fracasso de uma proposta concreta, aumentando a quota de mal no mundo, se converte automaticamente em sucesso da obra revolucionária de destruição.

Nada incrementou o poder do Estado comunista como o fracasso da coletivização da agricultura na URSS e na China (50 milhões de mortos em menos de dez anos). O fracasso de Stalin em usar o nazismo como ponta de lança para a invasão das democracias ocidentais converteu-se em aliança destas com os soviéticos e na subsequente concessão de metade do território europeu ao domínio comunista, o objetivo inicial do plano.

A queda da URSS, em vez de extinguir o comunismo, espalhou-o pelo mundo sob novas identidades, confundindo o adversário ao ponto de induzir os EUA à passividade cúmplice ante a ocupação da América Latina pelos comunistas.

Kirchner, Morales, Lula e Chavez. Aliança Bolivarina para "Recuperar na América Latina o que foi perdido no Leste Europeu"

Ahmadinejad e Lula

Mais ainda: como as propostas concretas não têm importância em si mesmas, não só cabe trocar uma pela outra a qualquer momento, mas pode-se com igual desenvoltura defender políticas contraditórias simultaneamente, como incentivar o sex lib, o feminismo e o movimento gay no Ocidente, enquanto se fomenta o avanço do fundamentalismo islâmico que promete matar todos os libertinos, feministas e gays.

Se não têm compromisso com propostas concretas, muito menos podem os revolucionários ter sentimento de culpa ante os resultados das suas ações. O que quer que aconteça no trajeto é sempre explicado, seja como destruição necessária, seja como reação do mundo mau, que deste modo atrai sobre si novas destruições, ainda mais justas e necessárias.

Isso é tanto mais assim porque o estado paradisíaco final a ser atingido não pode ser descrito ou definido de antemão, mas tem de criar-se por si mesmo no curso do processo. Por isso o movimento revolucionário não pode reconhecer como obra sua nenhum estado de coisas que venha a produzir historicamente. O que quer que esteja acontecendo não é – “ainda” não é – o socialismo, o comunismo, a joia perfeita na qual o movimento revolucionário poderá reconhecer, no momento culminante do Fim da História, o seu filho unigênito: é sempre uma transição, uma etapa, criada não pelo movimento revolucionário, mas pelo confronto entre este e o mundo mau.

Por sua própria natureza, a promessa indefinida é autoadiável, e nenhum preço que se pague por ela pode ser considerado excessivo, não sendo possível um cálculo de custo-benefício quando o benefício também é indefinido.

Vítima de Câmara de Gás - Auschwitz-Birkenau

A oitava maravilha do mundo, na minha opinião, é que pessoas alheias ou hostis aos ideais revolucionários imaginem ser possível uma convivência pacífica e democrática com indivíduos que, pela própria lógica interna desses ideais, se colocam acima de todo julgamento humano e só admitem como medida das suas ações um resultado futuro que eles mesmos não podem nem querem dizer qual seja ou quando virá.

Só o conservador, o liberal-democrata, o crente devoto da ordem jurídica, pode imaginar que a disputa política com os revolucionários é uma civilizada concorrência entre iguais: o revolucionário sabe que seu antagonista não é um igual, não é nem mesmo um ser humano, é um desprezível mosquito que só existe para ser esmagado sob as rodas do carro da História.

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Olavo de Carvalho é filósofo, escritor e jornalista e atualmente escreve para o jornal Diário do Comércio da Associação Comercial de São Paulo. É autor de vários livros, incluindo O Jardim das AfliçõesO Imbecil ColetivoO Futuro do Pensamento Brasileiro, entre outros. Além de ser fundador e editor-chefe do Mídia sem Máscara, possui dois websites: www.olavodecarvalho.orgwww.seminariodefilosofia.org.

Link da imagem do cartaz nazista:
http://www.calvin.edu/academic/cas/gpa/posters1.htm