Anos que passam

Desde os bancos da praia,
contemplando a areia…

A voz já calada,
os ouvidos cansados
os olhos, fechando
e o tédio aumentava.

Num suspiro constato
após novo desmando
que a vida é de fato
ver os anos passando…

Para lá e para cá,
seja indo ou voltando…
Ah…
Os anos passeando.

A memória embargada
da vida passada
quando eu era mais livre
pra assumir que pensava.

Agora penso e não falo,
já não sou mais tão livre
pra falar sem pensar,
manda a nova etiqueta:
– senão o falo vai cantar!

Neste meu ostracismo,
de alegria abafada,
qual terá sido o (s)”ismo”
que cortou minha estrada?

Procurei o epicentro
olhando os passantes,
talvez um vislumbre
revelasse o fim d’ “antes”.

Todos bem apressados,
sequer um me notava.
Finalmente, uma turma
encarou-me enfezada.

Uns com seus quépes verdes,
outros negras camisas,
alguns clones vermelhos,
sssibilantes divisas.

Irmanados no orgulho
ostentavam o pendão:
Saudação “nacional”,
levantavam-se as mãos…

Nada pude dizer,
em silêncio parti
pensando e andando,
não ousei dividir.

Sentei n’outro banco
de um cinza cimento
e o odor da areia,
encerrou meu tormento.

Respostas que grassam
no esgoto da praia:
– a merda é sempre igual,
os ânus é que passam.

Mensagem estelar

Stella, stellina...

O tempo nos dá oportunidade de redescobrir as mesmas coisas por novos caminhos.

Naquela manhã, já sozinho em casa, da varanda eu podia sentir uma brisa fria que descia a serra de encontro ao meu rosto, o céu meio cinza e a expectativa de mais um dia modorrento de fins de julho…

Dias assim são bons para não sair da cama, ou então aproveitar para por em ordem qualquer coisa: os afazeres da casa, uma lista, uma leitura, um trabalho por acabar. Às vezes, nesses momentos começamos a prestar atenção em coisas singelas e pensar na vida… Só isso.

Então o celular anunciou-se violentamente, quebrando a monotonia contemplativa com um susto daqueles que faz você ficar a alguns centímetros do chão por um instante. No mesmo pulo, virei cento e oitenta graus e fui até o aparelhinho conferir o chamado.

Um recado:
Papai, eu te amo.

De: Stella

Já disse que ela agora tem um celular?

A monotonia passou, entrou o “pensar na vida”. Então quer dizer que aquela coisinha, que outro dia mesmo (há 9 anos e meio) veio ao mundo, antenava-se à tecnologia e mandava pelo ar mensagem de amor para o papai. Que bonitinha! Receber essas mensagens é algo absolutamente MasterCard, não tem preço mesmo. Você ganha o dia, como quando da primeira vez que ela, anda bebê, sorriu para mim.

Depois o dia seguiu seu curso modorrento e previsível, cuidei das coisas “do lar” e entreguei-me à leitura.

À noitinha, nova mensagem:

Boa noite, pai.
Bjs, Stella

De: Stella

A noite foi ótima. Nada como ir dormir feliz!

* * * * * *

Então veio uma quarta-feira à noite. Quase vinte e duas horas. Tevê ligada, sono chegando. Toca o celular desesperadamente – o meu tem um toque assim, meio estressado – e lá vou eu atender.

Para minha alegria, lá estava no visor – STELLA:

– Alô?

A vozinha com timbre de limão, num misto de ansiedade e tristeza, falava sem respirar:
-Papai-sabe-aquele-negócio-de-você-querer-emagrecer?-Então-acho-que-você-tem-que-fazer-isso-mesmo-porque-eu-tava-vendo-um-programa-na-televisão-aí-eles-falaram-que-pessoas-gordas-têm-problemas-de-coração-e-outros-também-então-eu-lguei-porque-eu-fiquei-preocupada-papai-você-precisa-emagrecer!

-…????? (não respondi eu – falar o quê numa hora dessas?)

– Papai?

Falei a ela que ficasse tranquila, dei um beijo de boa noite, trocamos um carinho e desligamos.

“Puxa, uma criança nessa idade devia se preocupar com outras coisas…”

Pensei mais um pouco… quer saber?

Minha filha me ama. E muito!

Vou mesmo é tentar me cuidar melhor.

Nós dois merecemos isto.

Lição de brinquedo

Lição de brinquedo

Um de meus primeiros brinquedos

Um dos meus primeiros brinquedos

Quando o vi,
guardado ao pó,
revirei minha cabeça,
Para tentar uma lembrança…
Umazinha que fosse, só!

Porque sempre que eu o via,
me emocionava saber,
apenas saber, que ele sentira
o que juntos vivemos um dia.

Mas eu… Oras, eu de nada lembrava!

Como posso ter saudades
de um momento, numa história,
que insiste em me lembrar,
justo que dele não há memória?

Desisti de entender.
Melhor só contemplar,
à distância de outros tempos,
dos quais ele teimava em falar.

Acredito que lá estive,
e em todas as suas maravilhosas lembranças…
Justo aquelas que não mantive.

Assim decidi então:
– Serei para sempre seu cúmplice,
porque também fiz eu um dia
para alguém a quem queria
lembranças que nunca existirão.

Findo o conto, na memória…
De um brinquedo velho aprendi
que o amor dado a um filho,
com presente, ou com carinho,
é só o início de outra história.

P.S.: com um agradecimento à amiga Ana Paula Vilhena pelos bate-papos muito doidos no facebook, um dos quais inspirou o poeminha acima.

Do começo ao fim

No pricípio, havia os fins!
A idéia de ver a luz,
nas mãos, três desejos,
da sorte, nem um beijo.
.
Procurava, um pouco à frente,
procurava, e de repente,
No escuro, tateava
e as respostas me escapavam.
.
Um desejo desfeito,
no peito, um aperto:
– Que jeito?
A vida fez das suas…
Realidade crua.
.
Dois desejos perdidos,
desilusão no caminho!
Quanto mais à frente eu olhava,
mais para trás enxergava.
.
Três desejos caídos,
já à beira do precipício;
então beijei a sorte…
.
E nas mãos ficou a luz.
Nem idéia, nem desejo,
nem resposta, nem dinheiro.
.
Ficou fácil o difícil:
No fim, sobraram os princípios!