A batalha naval do fim do mundo

– B5!

– Água!

Quem aí já não passou bons momentos jogando Batalha Naval, aquela mesma, de papel e com quadradinhos?

Uma sucessão de pensamentos me fez lembrar do famoso passatempo, enquanto eu daqui acompanho os desdobramentos da esperada tragédia que assola cidades no estado do Rio de Janeiro.

Lembrei primeiro do meu pai, cujos encontros comigo sempre resultam em boas e longas discussões sobre tudo. E desse humor ranzinza, às vezes cáustico que herdei dele, Seixas em estado puro. Papai guarda no armário um pote cheio de rolhas, que de vez em quando ele mostra com um misto de orgulho e deboche: – É para quando vier a grande onda…

Numa dessas ele chamou minha atenção para o fato de que o fim do mundo não precisa de grande onda nenhuma. Nem grandes subidas de oceano ou mega derretimentos glaciais. Basta apenas um palmo de água permanente nas ruas. A Praça da Bandeira ou a região do Saara (ô, ironia besta), no centro do Rio, são pedaços do fim do mundo.

– Água!

Aí o amigo Romeu me lembrou hoje mesmo: o resultado da calamidade pluvial que se abateu na Austrália recentemente foi pouco mais de 3 dezenas de fatalidades, enquanto aqui sabemos que basta qualquer chuvinha dar uma engrossada para que aconteça o caos. Se for uma concentração pluviométrica acima da média, tragédia certa. E aqui no Rio isso é comum, embora a afirmação soe meio paradoxal.

– Água!

Corta para as notícias da tragédia desta semana no Rio.

Por alguma coincidência dessas, novamente o governador não está (nem) aí. Desta vez está de férias. Como, ao que parece, esteve nos meses entre a tragédia de Angra e Niterói e a atual. Na sua batalha naval, Sérgio Escabroso insiste na mesma jogada – faz um “número 2”  para todos nós. E sempre o mesmo resultado:

– Água! (Hmmm…. Número 2 + água? Será diarréia encefálica?)

Para fazer justiça, a culpa não é só dele, claro. Há décadas que a história se repete: quem tem grana, paga um por fora e constrói onde quiser. Quem não tem grana, dá uns votos e constrói onde quiser. E quem tem ou não tem grana, mas gosta de agir dentro da lei, consegue a sua licença para construir, ou compra sua casinha num lugar “legal”, e eventualmente se descobre em local de risco. Talvez tarde demais. A chuva vem e fode todo mundo democraticamente.

Aí vem o sol e ganhamos uns meses para montar nossa estratégia e continuar o jogo.

Ano que vem chegará novamente a vez da natureza jogar:

– 22° 54′ S, 43° 12′ W…

– Água! Muita água!